Avanços nas áreas de biotecnologia e ciências dos materiais estão criando novas oportunidades com potencial para alterar fundamentalmente a conexão entre o ambiente construído e o mundo natural. A construção e seus materiais representam cerca de 11% das emissões de gases causadores do efeito estufa. O setor de arquitetura, engenharia e construção pode contribuir para a contenção das mudanças climáticas nos próximos anos, e a reavaliação dos materiais convencionais de construção é uma das medidas mais críticas. Materiais de bioengenharia, que crescem, produzem energia, se auto-regeneram são a próxima fronteira na biologia e nas ciências materiais e potencialmente o caminho em direção a um novo tipo de arquitetura. Embora a inovação nesses campos ainda esteja longe do uso comercial, ela promete mudar dramaticamente a face do ambiente construído.
Materiais vivos aplicados ao ambiente construído são uma área de pesquisa em rápida expansão que serve a uma série de objetivos, desde a redução das pegadas de carbono, otimização ao uso de recursos, desenvolvimento de propriedades inovadoras e sequestro de carbono. Na interseção entre design, ciências materiais, química e bioengenharia, materiais vivos de construção (living building materials - LBMs) contém microorganismos e mostram propriedades biológicas. A pesquisa a seguir demonstra como estes materiais podem alterar a materialidade na qual opera a arquitetura.
Substituindo a produção tradicional com crescimento orgânico
Na Universidade do Colorado Boulder, o Laboratório de Materiais Vivos investiga um novo material de construção vivo, livre de cimento que, diferentemente do concreto, é totalmente reciclável. A equipe usou uma cianobactéria, microorganismos verdes similares a algas que usam o CO2 e a luz do sol para crescer, e fabricou um cemento biológico que ajuda a sequestrar CO2 da atmosfera. Aproveitando o crescimento exponencial da bactéria, os pesquisadores fizeram os blocos de construção, demonstrando um novo método potencial de manufatura. A aplicação dessa tecnologia na vida real já está aqui, enquanto algumas empresas estão pedindo a adoção desses materiais aprimorados incorporando o biocimento em seus produtos, por exemplo.
O micélio é uma outra área prolifica de investigação para materiais de construção que podem ser cultivados, já que os materiais que utilizam o fungo como base possuem boas propriedades de isolamento térmico, são retardantes de chamas e não produzem gases tóxicos. Em 2014, o The Living criou o Hy-Fi, a primeira estrutura em grande escala feita de tijolos de micélio, que poderia ser cultivado em 5 dias. Na Nasa, materiais baseados no Micélio são pesquisados como opções viáveis para a arquitetura espacial, precisamente pelo potencial de cultivo in-loco, em um contexto onde o volume dos materiais transportados precisa ser reduzido a um mínimo.
Materiais auto-regeneradores para um menor consumo de recursos
Como o concreto é responsável por quase 9% das emissões globais de carbono, vários empreendimentos de pesquisa são focados em descobrir alternativas para o concreto tradicional, repensando seu processo de produção para descobrir soluções para diminuir a demanda. No Instituto Politécnico de Worcester, os pesquisadores desenvolveram um tipo de concreto auto-reparador, utilizando uma enzima que transforma o dióxido de carbono da atmosfera em cristais de carbonato de cálcio, selando rachaduras em escala milimétrica, e prevenindo danos adicionais ao material. Diferentemente dos experimentos utilizando concreto auto-reparador com bactérias, esse processo é mais rápido e não representa qualquer risco de segurança.
Testes na vida real e aplicações arquitetônicas
O Hub para Biotecnologia no Ambiente Construído é um projeto de pesquisa que junta cientistas da área de biologia da Universidade de Northumbria e arquitetos, designers e engenheiros da Universidade de Newcastle que trabalham para desenvolver biotecnologias que podem ajudar a criar construções responsivas aos seus ambientes. A pesquisa foca na produção de materiais vivos de engenharia que podem metabolizar seus descartes, ajudar a reduzir a poluição, e fazer os processos de construção serem mais eficientes e até mesmo gerar energia. Para testar as descobertas em escala de construção, a iniciativa de pesquisa construiu uma estrutura experimental dentro do campus da Universidade de Newcastle que pode ajudar a replicar um espaço doméstico. No OME, os pesquisadores irão experimentar com os materiais, desenvolver processos para converter lixo doméstico em aquecimento e energia, e testar novos sistemas de fachadas, além de influenciar os microbiomas da construção.
O Laboratório Integrado de Pesquisa em Design na Universidade da Carolina do Norte Charlotte desenvolveu um sistema de fachada adaptável de microalgas que melhora a qualidade do ar em ambientes internos e produz energia renovável através de fotobioreatores integrados. Com a janela biocrômica, o ar é introduzido dentro do sistema de fachadas, e o oxigênio produzido pelas algas é introduzido no sistema de climatização do edifício. Algas frescas são introduzidas regularmente no sistema, e as carregadas de carbono descem para o fundo e são transferidas a um componente que as converte em biocombustível. O sistema foi adaptado e desenvolvido para uso comercial.
Esses são alguns exemplos desse campo de pesquisa em expansão, e pintam uma imagem abrangente do que uma indústria de materiais de construção sustentáveis poderia ser. Indo além, mais pesquisas são necessárias para avaliar questões como a segurança e a biocontaminação. Além disso, esses novos materiais teriam que conquistar a opinião pública, que sempre está relutante em relação ao mundo bacteriano. O campo da engenharia de materiais vivos ainda está nos primeiros dias, e há ainda um longo caminho da pesquisa laboratorial até a viabilidade comercial. Entretanto, a pesquisa abre um caminho em direção a um novo mundo material e a um novo nível de sustentabilidade em arquitetura.